A realidade, entretanto, não é uniforme no país. Enquanto São Paulo consegue realizar transplantes em questão de meses, estados como Ceará e Mato Grosso sequer têm filas. Segundo Medeiros, a diferença está na organização e eficiência dos bancos de olhos. “São Paulo possui uma rede estruturada, com processos padronizados, integração com as centrais de transplantes e forte conscientização da população. Já o Rio sofre com baixa cultura de doação, dificuldades de captação em áreas de risco e, durante a pandemia, uma queda brusca, já que um dos principais bancos de olhos do estado funciona em um hospital que concentrou leitos para pacientes com Covid-19”, detalha.
De acordo com o médico oftalmologista, a inteligência artificial, o big data e a telemedicina podem transformar a gestão da fila. “A IA pode tornar a lista de espera mais inteligente, priorizando pacientes conforme acuidade visual, idade e risco de progressão da doença. Além disso, a telemedicina já tem permitido confirmar indicações e triar prioridades em áreas distantes”, explica. Nos bancos de olhos, a automação de protocolos poderia acelerar a triagem de doadores, otimizar notificações e até auxiliar no contato com familiares. Outro ponto são as técnicas avançadas de preservação, como a preparação de tecidos para transplantes parciais, também ajudariam a reduzir a espera.
Outro desafio é financeiro. Os repasses públicos não acompanham a inflação e os insumos são importados, encarecendo o processo. Medeiros defende atualização periódica dos valores e incentivo à produção nacional. “Uma unificação nacional do sistema de transplantes, com compra centralizada de insumos, poderia reduzir custos e aumentar a eficiência”, diz.
O que o Brasil pode aprender com outros países.
Apesar das dificuldades, o Brasil segue como referência internacional pela habilidade dos cirurgiões e pela criação de técnicas inovadoras. Segundo o especialista, é possível avançar ainda mais com a adoção de tecnologias já utilizadas em países como Canadá e Austrália, como tecidos pré-preparados para transplante (pre-loaded), novos medicamentos e equipamentos de ponta.
De acordo com o CBO, mais de 31 mil pessoas aguardam por transplante de córnea no Brasil. Entre elas, quase metade (47%) tem mais de 65 anos, faixa etária mais atingida por doenças degenerativas da córnea. Outro grupo expressivo é de jovens com ceratocone, que representam 17% da fila. Para Medeiros, a tecnologia pode reduzir esse impacto. “Para jovens, o diagnóstico precoce e tratamentos como o Cross Linking podem evitar a necessidade de transplante. Para os idosos, a possibilidade de dividir uma mesma córnea entre dois receptores é decisiva.” O médico acrescenta que o futuro já aponta para novas soluções: “O futuro aponta para mais transplantes parciais, uso de células-tronco, cultivo de tecidos e medicamentos que retardam ou até revertem alterações degenerativas da córnea. Precisamos apenas que os órgãos reguladores sejam mais ágeis na liberação dessas inovações”, pontua.
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